O Tal do Perfil Psicológico

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Um dos meus estratagemas prediletos para solidificar, em ambientes públicos de acasalamento, uma conexão com uma fêmea da espécie consistia em declarar-me de posse de um perfil psicológico da vítima em questão.

O perfil, eu dizia, havia sido cunhado por mim com base nas poucas frases trocadas em meio à barulheira ambiente, e mais algum reforço obtido da rápida observação da fêmea no meio de uma pequena multidão enfumaçada.

Eu disse “enfumaçada”? Sim, eu disse. Eram outros tempos, de cigarro nos botecos e de Gilvas nos botecos, mais uma vez confundindo Don Juan com Don Quixote em suas empreitadas socio-sexuais.

Na época, o princípio de funcionamento desta abordagem era o de atiçar a curiosidade do alvo, que, sabidamente, compartilha com o felis silvestris catus da mesma característica exacerbada. Este expediente permitia que mais alguns tijolos se juntassem ao tímido “oi” da primeira abordagem, estruturando um muro onde o indivíduo caçador pudesse se debruçar e aplicar outras ferramentas de convencimento.

A curiosidade, eu presumia por minhas observações de campo, provinha de uma dúvida íntima traduzível por “o que diabos este babaca sabe de mim que eu não sei?”. Daí a um beijo e mais outros, e posteriores ações mais avançadas, seria um passo, pensava o babaca em questão.

Sinceramente, eu não lembro se isto funcionava, pois eu continuo entendendo tanto de mulheres quanto entendo de física das partículas, ou seja, o suficiente para discutir animadamente num balcão de bar.

Ou para escrever sobre isso num blógue.

Divagações, sim, divagações, mas pus-me a destrinchar o mecanismo daquela curiosidade. De um lado, a realização do ego: alguém se interessa por saber o que eu sou, alguém me enxerga como alguém que merece ser observado, quiçá desejado. De outro, o receio da perda da privacidade: estarei me expondo, como esta pessoa, ainda mais com estes modos de ogro, pôde saber algo, estarei assim tão devassável?

A base psicológica para este texto é obviamente barata como uma lata de nova Schin, e não mudará a vida de ninguém. Entretanto, a brincadeira do perfil psicológico foi a base de muitas conversas divertidas, e, não, não lembro de algum dia ter descrito para alguém aquele perfil de que falava.

***

Este texto, de certa forma, foi motivado pela elogiosa propaganda feita do Sinestesia no Neuroblog. A Ana me fez ver um viés interessante no que venho escrevendo, algo que eu não tinha percebido ainda. E ela é fã do Neil Hannon, minha gente!

***

De volta ao mundo real, e tentando ser útil, convoco os meus leitores, notadamente os que se importam com proteção animal, a clicarem aqui, e descobrir porque a Época consegue ser pior do que a execrável Veja. Deixei um comentário lá, e seria legal se outras pessoas também explicassem porque a matéria é tão babaca assim.

Sobre gilvas

Pedante e decadente, ao seu dispor.
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5 respostas para O Tal do Perfil Psicológico

  1. Milene disse:

    Legal o elogio no blog dela! Realmente teus textos são bem interessantes, independente do assunto.

    Em relação ao artigo na revista, não dava pra esperar algo muito diferente. Abordagem infeliz do assunto…

  2. Ana Corina disse:

    Beleza, vou ler agora então.
    Pô, na boa? Essa função de abrir a janelinha com a figura do site linkado é DEVERAS IRRITANTE e pode ser retirada, sabia?
    😉

  3. “eu continuo entendendo tanto de mulheres quanto entendo de física das partículas”.. pois bem, estando na posição de uma dessas “partículas”, eu diria: “sorte a sua”. A partir do momento que eu passei a entender os homens e verificar a dificuldade de achar espécimes que fossem exceção à regra de comportamento, a coisa perdeu totalmente a graça…

  4. Ana Corina disse:

    Gilvas, não dá pra ler o Neuroblog…

    Qto. ao teu texto, bem… É a tua cara. kkkk. E quem te conhece pessoalmente acha mais graça ainda e consegue te ver nas situações ao contar os mimimis.

    😉

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